Enquanto fenómeno social e culturalmente construído, a memória coletiva é o resultado de uma articulação pública, sempre mediada por um gesto, uma palavra ou uma tecnologia. O caráter efêmero ou permanente, significativo ou anódino, de um evento constrói-se em torno dos recursos tecnológicos que intervêm na sua comunicação. Para Nicolas Bourriaud, este fenómeno de mediação possibilita uma transfiguração das informações como matéria sensível, permitindo a sua reprodução e reinserção no tecido cultural.
Com o intuito de produzir um objeto editorial, o projecto baseia-se da recolha, análise e edição de informações publicadas em media digitais sobre um evento cultural. Enquanto exercício de reflexão e de experimentação formal, o projecto faz uso dos media sociais e das interações e fragmentos de informação gerados em torno de um evento, como forma de meta-documentação. Enquanto projecto editorial, explora o conceito definido por Alessandro Ludovico como post-digital publishing, que situa a publicação na diluição de limites entre velhos e novos media, através do cruzamento e diálogo entre o meio digital e o impresso. A edição impressa torna-se assim nexo entre as dimensões física e digital e dos seu papéis na mediação de um evento.
O evento visado nesta edição é a primeira bienal de arte contemporânea de Portugal, BoCA Bienal 2017, por via de conteúdos publicados e partilhados na rede social Facebook ao longo do tempo. As informações publicadas no Instagram, websites, blog e imprensa nacional e internacional, convergem na timeline do evento, gerando uma trama de informação e métricas de interacção social.
Segundo uma abordagem experimental [im]permanência procura tirar partido criativo e estético da complementaridade de meios e suas dinâmicas de publicação, ao explorar as dimensões quantitativa, qualitativa e relacional da informação que circula online como memória residual de um evento efémero.
[im]permanência é um projeto que recolhe os fragmentos de informação publicados em torno de um evento cultural; neste caso, a BoCA Bienal 2017 e a informação que gera na rede social Facebook. Entende-se que estas informações documentam a experiência do evento e possibilitam a permanência do efémero. Desta forma, o projeto pretende evocar a linguagem e a materialidade instável, bem como o imediatismo característico das dinâmicas de publicação nos meios digitais. Procura, assim, evidenciar a dimensão performativa da interação social, bem como as possibilidades técnicas, formais e estéticas dos novos media na reconstrução e mediação do evento.
Para a criação deste objeto editorial partiu-se da convergência das informações na rede social e das suas métricas de interação, explorando-se tanto a dimensão quantitativa como a qualitativa e relacional. A dimensão quantitativa é analisada a através da visualização de dados mensuráveis, denotados em números como likes, partilhas, assistência aos eventos, reproduções e visitas aos links. Por sua vez, a dimensão qualitativa trata os conteúdos textuais, os registos fotográficos e conceitos inerentes a um acontecimento, numa perspetiva simbólica e formal. Por último, e segundo uma abordagem relacional desenvolvida pelo autor/editor, propõe-se o mapeamento selectivo de obras e conceitos relacionados com o evento, como uma forma de descoberta e extensão da sua experiência quando mediada pelos meios digitais.
A partir de uma lógica de pós-produção, o projecto explora uma linguagem que procura evidenciar a actual dialética entre o analógico e digital. [im]permanência manifesta assim a fragmentação da informação e as conexões que são inerentes à sua publicação nas redes sociais. Recolhe e recompõe fragmentos, para propor uma reflexão sobre as formas de permanência e memória possibilitadas pelos meios digitais.
O objeto, criado a partir da lógica de post-production, vale-se das publicações e métricas de interação para propor uma linguagem que evidencie a contemporaneidade dialética entre o analógico e digital. [im]permanência manifesta a fragmentação da informação como também as conexões que atravessa cada publicação na rede social. Recolhe e recompõe os fragmentos latentes, para propor uma perspetiva e uma reflexão sobre as formas de permanência permitidos pelos meios digitais.
BoCA Bienal 2017 apresenta-se como um espaço de recolha e análise de informação fértil, concordante com os objetivos do projecto [im]permanência. A sua duração relativa, a comunicação prévia e pós evento, os 45 dias de atividades, a quantidade e diversidade de artistas e das propostas que integram a programação, bem como o uso que o evento fez das redes sociais, tornam o evento propício a uma exploração quantitativa, qualitativa e relacional da informação que gerou.
Na sua existência, toda complexidade possibilita uma determinada ordem; a sua estrutura não linear e rizomática exprime relações e conexões entre unidades significantes e fragmentos de informação. Partindo da noção de hipertexto de Ted Nelson, e alargando-a à estrutura rizomática de publicações nos media digitais, como um “livre” campo de partilha de informação, define-se um labirinto Borgeano, onde a informação permanece latente até ser ativada, processada ou lhe ser atribuída uma nova significação.
Num tentativa de explorar o potencial desta re-activação de sentido, que emerge do estabelecimento de conexões entre fragmentos, a dimensão relacional serve-se de um conjunto de unidades significantes para as expandir a outras informações. Esta dimensão encontra em Borriaud a sua definição, enquanto processo da passagem de uma relação de contemplação para uma relação de utilização da informação – uma ação subjetiva, crítica e (re)significante.
O que se procura explicitar nesta parte da publicação é a intenção e a descoberta subjetiva do editor enquanto autor. A informação que emerge da timeline do evento, é destacada, selecionada e complementada, revelando o interesse por determinados projetos através da activação de conexões, fora da rede social, com outros links, conteúdos, obras, autores e projetos.